Um projeto da Justiça do Tocantins está resgatando processos judiciais do século XIX e transformando as histórias em animações. O primeiro caso a ser recontado é o da Paula, mulher que foi escravizada, mas que conseguiu a liberdade na Justiça, 30 anos antes da assinatura da Lei Áurea, em 1888.
A iniciativa surgiu após uma determinação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para que os órgãos preservem, valorizem e difundam os bens culturais e imateriais do Poder Judiciário.
A ideia de transformar as sentenças em desenhos animados partiu do servidor público e mestre Whebert Araújo.
“Durante a dissertação, eu já visualizava que nós poderíamos trabalhar com a memória da Escola da Magistratura. Só que contar a timeline da história da escola seria uma coisa curta. Então nós fomos atrás da memória do Judiciário Tocantinense. Nossa ideia foi fazer um trabalho que contasse meio que uma história em quadrinhos ou um desenho animado, para que novas gerações se interessem por essa riqueza histórica que nós temos”, explicou.
Os casos judiciais são histórico, registrados nas cidades mais antigas do então norte goiano. Os documentos ficaram por décadas em arquivos, correndo o risco de se perder para sempre.
“Esses documentos, eles são raros por vários motivos. Um deles é que nós estamos em uma região que tem uma grande umidade, então perder esse papel era muito fácil. Ainda temos muitos outros documentos espalhados em regiões distintas do estado”, explicou o historiador Marcelo Rodrigues.
O projeto é formado por vários profissionais. A bibliotecária Cinthia Valéria Aires foi a responsável pela catalogação. “São muitos processos. A gente separa cada processo, e vai lendo, catalogando. A gente pega o nome das partes, dos juízes, das autoridades. A gente coloca tudo em um resumo da historinha. O que aconteceu com aquelas pessoas”, explicou.
Depois, as histórias ganham vida pelos contornos do caturnista Geuvar Oliveira. Os desenhos dele estão se tornando animações. A primeiro caso a ser recontado comoveu o artista.
“Como eu sou negro, e fala da mulher em situação de escrava e da história do Tocantins nessa relação, então profundamente me afeta e eu tenho uma empatia enorme com isso. Eu imagino ela, a vida dela e trabalho em cima disso. Dessa sensação, dessa empatia mesmo”, comentou.
O projeto quer, ainda esse ano, trazer ao conhecimento do público mais cinco processos judiciais históricos relevantes do século XIX. Entre eles o caso do cruel assassinato de um indígena Xerente em 1828.
Para o desembargador do Tribunal de Justiça do Tocantins, Marco Villas Boas, o projeto relembrará fatos que a sociedade passou para evoluir no que diz respeito a direitos fundamentais.
“Isso é importante para determinar a nossa visão de futuro. O conhecimento das causas que nos trouxeram até aqui no dia de hoje e tudo o que a sociedade passou para poder se constituir como um corpo que respeita a pluralidade, que considera a dignidade da pessoa humana, os direitos fundamentais”.