Além da propaganda dos candidatos, toda campanha eleitoral costuma ser marcada pela repercussão de dois instrumentos na opinião pública. Primeiro, as pesquisas de intenção de voto. Segundo, a sucessão de sabatinas, entrevistas e debates com candidatos. Em conjunto, as informações produzidas por ambos ajudam o eleitor a tomar suas decisões e funcionam como uma batida rítmica que marca o andamento do noticiário até o dia da votação.
Nesta semana, essa música começou a tocar. O calendário de pesquisas periódicas foi inaugurado pelos números do Ipec e do Datafolha — e se estenderá até o dia da eleição, com os solavancos e as surpresas de costume. Ao mesmo tempo, os veículos da imprensa profissional começaram a publicar suas entrevistas e sabatinas. No GLOBO, elas iniciaram pelos postulantes ao governo paulista. Os principais candidatos à Presidência, entre eles o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o presidente Jair Bolsonaro, já aceitaram participar da tradicional entrevista à bancada do Jornal Nacional, a partir de segunda-feira. Quanto aos debates, embora já tenha havido o primeiro confronto entre candidatos a governador, é provável que, como aconteceu em 2018, falte outra vez ao brasileiro um embate entre os líderes na disputa presidencial.
Depois de sinalizarem que participariam do debate do consórcio entre O GLOBO, Valor, g1, UOL, Folha de S.Paulo e O Estado de S. Paulo, as campanhas dos dois foram incapazes de se comprometer no prazo estipulado. Lamentavelmente, fugiram (o consórcio continua aberto a realizar o evento). Lula confirmou que iria a outro debate marcado para o dia 28, mas informou que poderia desistir se Bolsonaro não fosse. As presenças são incertas.
Em vez de participar de debates com regras claras e equilibradas, em que suas ideias e propostas seriam submetidas a questionamentos de cunho jornalístico e confrontadas com o contraditório, os dois principais candidatos têm dado preferência a ambientes onde são tratados com deferência, inquiridos por “youtubers”, “podcasters” ou “influencers” sem experiência nenhuma em cobertura política nem compromisso com princípios editoriais transparentes regidos pelo interesse público (o exemplo mais recente foi a participação de mais de cinco horas de Bolsonaro no podcast Flow).
É óbvio que as campanhas têm o direito de agir de acordo com o que consideram ser interesse dos candidatos, por isso é natural que prefiram apostar na propaganda e em figuras da internet com poder de atrair grande audiência. Mas apenas o jornalismo profissional é capaz de informar o eleitor de modo fidedigno e competente. A ausência dos líderes das pesquisas dos debates contribui para deteriorar a qualidade da informação oferecida aos cidadãos e representa um retrocesso para a democracia brasileira, num momento em que não lhe faltam ameaças e em meio a uma guerra de versões e narrativas.
Tanto Bolsonaro quanto Lula agem para evitar um confronto que traria questionamentos incômodos, como se tivessem medo de virem à tona temas que prefeririam manter longe da campanha. É um comportamento infantil, que desrespeita o eleitor. O brasileiro merece receber toda informação a que tem direito para tomar a melhor decisão possível. Não existe melhor forma de informá-lo que debates equilibrados e transparentes, seguindo os princípios do jornalismo profissional.
Fonte: O GLOBO